Exames genéticos realizados em moradores do Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, indicam que linhagens do coronavírus evoluíram localmente, originando novos tipos de vírus. Alguns desses novos vírus foram detectados em pessoas de outros países, como Estados Unidos e Suíça. Essa descoberta destaca o impacto global da circulação viral em comunidades densamente povoadas.
Entre 2020 e 2021, a taxa de mortalidade por covid-19 na Maré atingiu entre 10% e 16%, quase o dobro da média registrada na cidade do Rio de Janeiro. Segundo o estudo “A circulação viral em favelas tem impacto global?”, conduzido pela Fundação Oswaldo Cruz, linhagens da variante Gamma surgidas na Maré foram associadas a casos no Brasil e outros países, como Estados Unidos e Suíça.
Mutações da variante Delta também foram rastreadas na comunidade, com registros de infecções em estados brasileiros, assim como em nações como Índia, China e África do Sul. Adicionalmente, variantes da Ômicron encontradas na região serviram como ancestrais para casos registrados na América Latina e no Brasil.
Foram analisadas amostras de cerca de 500 moradores da Maré infectados pela covid-19. O objetivo era compreender o impacto da circulação viral no complexo. Segundo o pesquisador Thiago Moreno Souza, condições estruturais desfavoráveis, como saneamento básico precário e moradias insuficientes, favorecem a replicação e mutação de vírus respiratórios.
“Essas condições criam focos de maior transmissão, catalisando a dispersão viral em um contexto que vai além das fronteiras regionais”, afirmou Thiago. Ele também destacou o papel das favelas urbanas de grandes cidades cosmopolitas na disseminação de doenças infecciosas, dada a proximidade com centros urbanos densamente conectados globalmente.
O estudo publicado na revista científica Frontiers in Microbiology reforça a urgência de priorizar favelas em estratégias e recursos de saúde pública. Melhorar infraestrutura básica como acesso à água potável, saneamento e assistência médica pode aumentar a resiliência frente a futuras crises de saúde global.
Com mais de um terço da população mundial projetada para viver em favelas até 2050, a pesquisa adverte que a compreensão de dinâmicas infecciosas nesses territórios é fundamental para prevenir impactos globais. “Frequentemente, essas áreas apresentam uma prevalência maior de doenças infecciosas em comparação a outras zonas urbanas”, concluíram os pesquisadores.